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Nem tudo está perdido...


Acredito nessa possibilidade quando relembro a obra prima de Shakespeare, que é o discurso de Marco Antonio nos funerais de Cezar. Uma parábola, para os dias de hoje...

Talvez, o leitor com alguma acuidade faça uma analogia do que se pode esperar de um bom plano estratégico para reverter expectativas eleitorais oposicionistas e oportunistas...

A cena é a seguinte:              
                                
Cezar está morto, e Brutus, o assassino, é chamado para dizer à população romana, junto ao cadáver, porque motivos matou Cezar.

Imaginem uma multidão ululante, pouco favorável a Cezar, que já acreditava que Brutus tivera um gesto nobre, matando-o.

Brutus sobe a tribuna e faz um breve e pragmático relato das razões que o levaram a suprimir Cezar. Conhecido e querido por se identificar com os anseios populares, não viu nenhum motivo para preocupar-se com o clamor das ruas, pois essas eram as mais favoráveis possíveis. Convencido que havia dito aquilo que era esperado, sentou-se sob aplausos. A sua atitude refletia aquele que julga que a sua palavra vai ser aceita sem discussão; era uma atitude altiva, de quem está acostumado com as vozes das ruas e o clamor popular.

Como era de se esperar, Marco Antonio teria que subir à tribuna, sabendo que a multidão é contra ele, por ser amigo do arrogante e reativo Cezar.

Num tom de voz humilde, baixo, porém firme, Marco Antonio começou a falar:
Povo de Roma,
Venho vos falar em nome de Brutus!

Alguém mais cético na multidão pergunta o que era esperado: O que dirá ele sobre Brutus?

Alguém ao lado, responde: Diz ele, que é em nome de Brutus que se encontra aqui para falar. Acho melhor que não venha falar mal de Brutus aqui.
Um cidadão comum, diz: Esse Cezar era um tirano, distante do povo.
Ao lado, um cidadão: Certamente. É uma felicidade o ocorrido, Roma assim se verá livre dele.

Alguém na multidão grita: Silêncio! Ouçamos o que Marco Antonio vai nos dizer...

Obs.: Vamos observar agora como se neutraliza as mentes daqueles que estão arrebanhados por um inconsciente coletivo apaixonado...

Marco Antonio: Amáveis romanos!

Todos: Silêncio! Ouçamo-lo!

Marco Antonio: Amigos, concidadãos, romanos, prestai-me atenção: aqui estou para enterrar Cezar, não para louvá-lo.

Obs.: Acabara de aliar-se ao estado de espírito dos ouvintes.

O mal que os homens praticam lhes sobrevive; o bem, porém, é sempre enterrado com seus ossos... O mesmo acontece com Cézar. O nobre Brutus vos afirmou aqui nessa tribuna que Cézar era um ambicioso, um reativo, perseguidor, um incapaz de ouvir o clamor das ruas. Se assim era, ele cometeu uma falta muito grave, mas já passou por ela...

Aqui, com a permissão de Brutus e de seus companheiros, - porque Brutus é um homem respeitável e assim, são todos os homens de bem, - venho falar-vos nos funerais de Cezar.

Era meu amigo; foi justo e leal comigo; Brutus, porém, disse que ele é um homem ambicioso, e Brutus é um homem respeitável. Todos vós vistes como nas Lupercais, por três vêses lhe apresentei uma coroa de rei e três vezes ele a recusou. Seria isso ambição? Entretanto Brutus disse que ele era ambicioso, e sem dúvida alguma Brutus é um homem respeitável. Falo aqui, não para desaprovar Brutus, mas para dizer o que sei...

Outrora, vós o elegestes e não sem um motivo justo. Agora, que motivos impedem de chorá-lo? Ó razão! Fugistes para as feras e os homens não raciocinam. Perdoai-me. O meu coração está na esfinge com Cezar. Devo parar até que ele volte para mim.

Obs.: Esta é uma parada obrigatória e estratégica, para dar tempo aos ouvintes de discernir às pressas, entre si, as suas afirmativas claras.

O objetivo aqui era observar o efeito que suas palavras produziam, ajudado por alguns desconhecidos amigos infiltrados na multidão.

Um amigo na multidão disse: Parece-me que há muita coisa nas suas palavras que precisamos ouvir para saber...

Um ouvinte cético comentou assim: Se considerares devidamente o assunto, verás que César cometeu grandes erros.
Outro amigo, retruca: Verdade, amigo? Temo que o seu substituto seja muito pior!

Outro amigo infiltrado diz: Prestastes bem atenção às palavras dele? Cezar não quis aceitar a coroa. Isso prova que ele não era ambicioso.

O primeiro amigo acrescenta: Se for assim, alguém pagará caro por essa possível substituição...

Outro amigo diz: coitado do Antonio! Chorou tanto que tem os olhos vermelhos.

O primeiro amigo diz: Não há em Roma homem mais nobre que Marco Antonio.

Alguém do povo: Atenção, ele vai começar a falar novamente.

Marco Antonio: Ontem, a palavra de Cezar podia dominar o o mundo; hoje ele jaz aqui e uma parte dos homens não o venera. Senhores! Se quisesse disputar, inflamar os vossos corações e as vossas mentes com a revolta e a cólera, acusaria Brutus, acusaria Cássio, que todos vós sabeis, são homens respeitáveis.

Obs.: Se Marco Antonio tivesse começado seu discurso com ataques, a história teria sido outra... Observem quantas veses Marco Antonio repete o termo “respeitável”. Vejam com que inteligência ele sugere que Brutus e Cássio não são tão respeitáveis assim, como julga a população romana. Esta sugestão é levada a efeito nas palavras “revolta”, “cólera”, “se eu quisesse despertar” e “acusaria”...

Vai ele agora construindo sutilmente frases que gerarão um novo estado de ânimo nos ouvintes. Apelou para a curiosidade da multidão em saber que “acusações seriam essas”...

Marco Antonio: Aqui está um pergaminho com o sinete de Cezar, que encontrei no seu gabinete; é o seu testamento, aquilo que ele deixa para o povo de Roma. Se ouvísseis a leitura deste testamento, o que, - perdoai-me, não pretendo fazer aqui, tenho a certeza que todos vós beijaríeis as feridas de Cezar assassinado, molharíeis os vossos lenços no sangue sagrado, imploraríeis fios de seus cabelos como lembrança.

Obs.: Agora, resolve aguçar mais ainda a curiosidade da população, pois a natureza humana sempre deseja aquilo que é difícil de conseguir ou daquilo que vai ser privado. Observe, que essas coisas uma vez obtidas, perdem o seu valor... assim, Marco Antonio despertou o interesse e a cobiça pelo Testamento de Cezar, preparando-os para o escutarem com um “espírito aberto”.

Todos gritavam: O Testamento! O Testamento! Queremos ouvir o que nos deixou Cezar.

Marco Antonio: Tende paciência, generosos amigos; não o devo ler. Não é bom que saibas agora o quanto Cezar os amou e fez por Roma. Não sois feito de pedra; sois humanos! E sendo humanos, ao ouvir poderíeis ficar furiosos. Não, não é bom saberdes nesta hora que sois herdeiros de Cezar, pois, se souberdes, que poderá acontecer? É imprevisível!...

Um amigo na multidão, grita: Queremos ouvir a leitura do testamento! Marco Antonio, lê agora o Testamento de Cézar!

Marco Antonio: Quereis ser pacientes? Quereis esperar um pouco? Fui muito longe falando nisso... Temo ter acusado homens respeitáveis que cravaram seus punhais no coração de Cézar.

Obs.: Sugeriu aqui um assassinato, chamando-os de assassinos.

O amigo na multidão aproveita e grita acompanhado de muitos: Estes homens respeitáveis são uns traidores!

Todos: O testamento! O testamento!

O amigo na multidão volta à carga: São uns vilões, uns assassínos! O testamento!

Marco Antonio: Exigis de mim a leitura do testamento? Então formai um círculo em torno do corpo de Cezar, para que vos possa mostrar o autor do testamento. Posso descer? Permitis isso?

Obs.:Nesse ponto, Brutus deveria segui o meu conselho: Pegar uma biga com uma ótima parelha de cavalos e cair fora!

Todos: Vinde!

Um cidadão: Descei!

Um desconhecido: Lugar, lugar para Antonio, o nobilíssimo Antonio.

Marco Antonio: Não fiqueis tão próximos de mim. Afastai-vos um pouco.

Obs.: Ele sabia que dando essa ordem ainda os aproximaria mais, e era justamente o que desejava.

Todos: Para trás, para trás.

Marco Antonio: Se tendes lágrimas preparai-vos para derramá-las! Todos vós conheceis este manto. Lembro-me da primeira vez que Cezar o vestiu. Foi numa noite de verão, na sua tenda, no dia em que bateu os Nérvios. Olhai: aqui penetrou o punhal de Cássio. Vede o rasgão que fez o invejoso. Foi aqui também, que o bem amado Brutus cravou o seu punhal. E, ao ser retirado este, como que o sangue de Cezar seguiu a lâmina, para se certificar de que era Brutus, quem o ferira tão impiedosamente, pois Brutus, como sabeis, era o anjo de Cezar. Chorais agora, pois percebo que vos sentis comovidos; derramai as lágrimas da compaixão. Olhai aqui; vede o próprio Cezar dilacerado pelos seus traidores.

Obs.: Observem que aqui, Marco Antonio emprega a palavra “traidores” porque sabe que as mesmas estão em harmonia com o que domina as mentes da população.

Um simples cidadão: Que triste espetáculo!

Outro cidadão: Que dia fatal!

Um amigo oculto: Havemos de vingá-lo!

Todos: Vingança! Vingança! Vamos buscá-los! Não deixemos vivo um só traidor!

Marco Antonio: Parai, concidadãos!

Um cidadão: Calma! Ouçamos o nobre Antonio!

O amigo oculto: Escutemo-lo, sigamo-lo, morramos com ele!

Obs.: Pronto!... a certeza agora era que a multidão estava com ele, Marco Antonio.

Marco Antonio: Generosos amigos! Não desejo incitá-los de maneira alguma à revolta. Os autores desse feito tinham seus motivos e eram homens respeitáveis. Que motivos tinham eles para agirem assim? Acredito que diante de tal tragédia, tenham motivos justificáveis. Não vim roubar vossos corações. Não sou um orador como Brutus, mas, como sabeis, um homem simples, franco; amava o meu amigo; eles sabiam disso muito bem, por isso me deram autorização para falar do meu grande amigo. Digo-vos apenas o que todos sabeis: se eu fosse Brutus e Brutus fosse eu, talvez pudesse inflamar os vossos espíritos.

Todos: Estamos revoltados!

Um amigo; Incendiaremos a casa de Brutus.

Outro: Vamos! Vamos!

Marco Antonio: Então amigos, não sabeis ainda o que fazer... em que Cezar vos mereceu tanta dedicação nesta hora? Esquecestes o testamento...

Todos: O testamento! O testamento!

Marco Antonio: Aqui está o testamento e com o sinete de Cezar. Para cada um de vós deixa setenta e cinco dracmas.

Um cidadão romano: Nobilíssimo Cezar! Vingaremos a tua morte!

Marco Antonio: Ouvi-me com paciência.

Todos: Silêncio!

Marco Antonio: Além disso, deixou para vós todos os jardins, todo seu parque e os novos pomares que ficam deste lado do Tibre. Este era o verdadeiro Cezar! Quando surgirá outro igual?

Um cidadão: Nunca, nunca. Venham! Vamos queimar o seu corpo no lugar sagrado e com as mesmas tochas incendiaremos as casas dos traidores. Levem o corpo!

Um dos cidadãos: Vão buscar o fogo!

E foi esse o fim de Brutus. O mais forte candidato a ser o sucessor de Cezar.

Obs.: Perdeu, apenas porque lhe faltou personalidade e bom senso para sugerir com bons argumentos e seguir de acordo com a receptividade da população romana, como fez Marco Antonio. Ao se julgar uma grande personalidade; inflacionou o seu ego, ficando obcecado e orgulhoso com seu feito. Achou que a realidade dos fatos podiam falar por ele e assim bastavam para impor decisões e justificá-las...

Caso Marco Antonio tivesse subido à tribuna com a mesma empáfia e arrogância, teria dito: “Agora, povo romano, permiti que vos diga uma incontestável realidade sobre Brutus... ele é um verdadeiro assassino”!...

Decerto não teria continuado, pois a populaça o teria apupado... hábil, usou de psicologia apresentando seu parecer e a realidade dos fatos, de tal modo, como não fosse uma ideia sua, mas da própria população de Roma. Basta observarmos como no seu discurso foi acentuado o “vós" e não o “eu”.



Comentários

  1. Hoje, um social mídia deve estar comprometido politicamente com quem ele serve, pois, pode se sentir tentado a servir a dois senhores...deve orientar o seu cliente a postar estrategicamente as respostas dos seus detratores...

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  2. Sei hoje, que estou acocorado comendo as migalhas de um banquete que ajudei a ficar pronto e ser servido, porém, não fui considerado devidamente pelo que ofereci, e muito menos convidado... quando chegar a hora, sei que serei lembrado, mais, pelo que recusei...

    Ouviram dizer: "passarinho que acompanha morcego, dorme de cabeça pra baixo"... só, que não sabem ainda quem é o morcego!...

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