– 28 DE SETEMBRO DE 2016
Mesmo em dificuldades financeiras, empresa obtém conquistas
operacionais expressivas. Mas seu presidente adota medidas que podem
inviabilizá-la, aproveitando-se do silêncio da mídia e da distração da sociedade.
Por Paulo Kliass, na Carta Maior.
Em um país que costuma apagar rapidamente eventos históricos
importantes de sua memória coletiva, nunca é demais recuperar fatos carregados
de significado. Tanto mais pelo simples fato de que, muitas vezes, tendem a se
repetir por aqui ensaios esfarrapados, como se fossem a maior novidade da face
da Terra.
Refiro-me, no caso, a todo esse carnaval que vem sendo feito
em torno da tentativa de desmonte que o governo Temer está tentando patrocinar
em cima de uma das maiores conquistas do povo brasileiro ao longo das últimas
décadas – a Petrobrás. A blindagem dos meios de comunicação em torno de
críticas às opções de política econômica se completa com a construção de uma
narrativa, segundo a qual a equipe é formada de indivíduos de elevada
competência técnica e profissional. E o mesmo fenômeno se dá com o Pedro
Parente, o indicado para a presidência da nossa petroleira. Tudo na base da
torcida e do embalo do “agora, vai!”.
Ocorre que, durante o governo FHC, já havia sido encaminhada
uma série de medidas com o mesmo objetivo de hoje: preparar o pacote para
viabilizar a privatização da empresa. Em 1999, por exemplo, o governo tucano
preparou o lançamento de ações do grupo para serem negociadas na Bolsa de Nova
York. Tal iniciativa nos era vendida como mais um importante passo para a nossa
aceitação no glorioso mundo das finanças internacionais. O pequeno detalhe –
para além de todas as demais implicações perigosas de natureza política,
financeira e econômica – residia no fato de que a empresa estaria sujeita às
chantagens e demandas judiciais no universo do financismo ianque e globalizado.
No ano seguinte, outra importante decisão foi tomada com
relação à empresa. No pior/melhor estilo de submissão ao “glamour” do ambiente
determinado pelos interesses do capital internacional, a equipe de FHC resolveu
que o nome do grupo era, digamos assim, por demais brasileiro. Assim, dando
seguimento ao caminho definido pelo complexo de vira-lata, ele deveria ser
alterado para uma referência mais internacional: Petrobrax. O então presidente
Reichstul dá início a essa complexa e custosa operação, que deveria sair por
US$ 50 milhões apenas para a mudança da logomarca. Estávamos em dezembro de
2000, articulou-se uma inédita resistência política entre o Natal e Ano Novo e
o processo terminou não se consumando. A empresa se manteve perante o mundo com
o nome pelo qual sempre fora conhecida.
Dezesseis anos depois, a coisa tenta se repetir.
Aproveitando-se da crise de imagem e das inegáveis dificuldades conjunturais
enfrentadas pela Petrobrás em função da Operação Lava Jato, o financismo
prepara-se para mais uma tentativa de bote. O atual presidente tucano da
empresa arvora-se direitos imperiais e começa a decidir isoladamente a respeito
do futuro do conglomerado estatal. Vale lembra que todas as vezes em que o PSDB
ensaiou colocar o tema da privatização da Petrobrás na pauta de disputa
eleitoral, foi fragorosamente derrotado nas urnas. Assim, torna-se bastante
compreensível que tenha se aproveitado do subterfúgio de chegar ao poder pela
via do golpe para implementar tal estratégia.
Dessa forma, Parente decidiu que não interessa mais à
empresa a participação em áreas estratégicas, a exemplo de biocombustíveis,
distribuição de GLP (gás de cozinha), produção de fertilizantes e petroquímicas.
De acordo com o novo plano de negócio divulgado há poucos dias, a Petrobrás deveria
se voltar exclusivamente para a simples exploração de óleo e gás, justamente o
tipo de atividade que gera menos valor agregado. Reproduzimos aqui o velho
esquema neocolonialista de produtor/explorador de “commodities” na periferia,
ao passo que as atividades mais estratégicas ficam para os países do centro do
mundo.
Além disso, a orientação estabelecida por Parente para os
próximos anos é de “desinvestimento”, termo charmoso do financês que significa
nada mais, nada menos que a privatização de ativos (empresas) existentes no
grupo e a retirada estratégica do crescimento previsto em áreas nobres do
setor. Sob o argumento falacioso de que a Petrobrás estaria “quebrada”, não
restaria alternativa do que a venda de seu patrimônio para solucionar problemas
de endividamento.
No mais típico estilo monárquico do “Estado sou eu”, Parente
resolveu que o Brasil não precisa de uma Petrobrás tão forte e influente. E
ponto final. Como se não bastasse esse tipo de postura autoritária e
antidemocrática, ele também decidiu que os programas de conteúdo nacional
tampouco são benéficos ao país e à empresa. Assim vai sugerir mudança na
legislação e abrir escancaradamente a possibilidade de importação dos
componentes dos núcleos de alta tecnologia exigidos no processo operacional
produtivo. Ora, se há problemas de fornecimento no modelo atual, o estímulo
deve ser na direção de melhor capacitar a indústria nacional para tal missão e
não abrir esse precioso mercado para a China e demais países.
Esse é um dos aspectos do verdadeiro desmonte que se
pretende impor, sem que nossa população seja sequer consultada a esse respeito.
Há uma enorme confusão entre as perdas derivadas dos efeitos da Operação Lava
Jato e a situação real da maior empresa petrolífera do País. A Petrobrás
continua sendo uma das maiores e mais importantes empresas petrolíferas do
mundo. Atualmente ela ocupa a 14ª posição. E vale a observação de que a grande
maioria das empresas que estão à sua frente é também estatais ligadas a países
que possuem níveis elevados de reservas a serem exploradas. Estão ali no topo
da lista empresas públicas de Arábia Saudita, Noruega, Irã, México, Kuwait, Abu
Dhabi, Rússia, Argélia, Qatar, China, Iraque, Venezuela e outros.
Assim, ao contrário do que pretende nos enganar o libelo
privatista, a maior parte das grandes
petroleiras do planeta é composta de empresas públicas. O blá-blá-blá
privatizante não se sustenta entre os que conhecem minimamente o funcionamento
de um mercado tão específico e complexo como esse. As reservas do Pré Sal são a
garantia plena e segura de que os problemas atuais da Petrobrás podem ser
facilmente solucionados no médio prazo, com a consolidação das dívidas
acumuladas e a urgente retomada dos investimentos. Não é necessário privatizar
para superar a crise. Pelo contrário, recuperar a Petrobrás é essencial para
retomada do crescimento de nossa economia, tendo em vista sua importante
contribuição na formação do investimento agregado e na manutenção da atividade
econômica de forma geral.
A cada semana que passa, são divulgadas novas informações a
respeito da produção física da empresa. As últimas estatísticas são relativas
ao mês de agosto. No mês passado batemos novo recorde na produção total de
petróleo e gás no Brasil. Além disso, foi atingido no mês um novo valor máximo
na média diária de exploração de petróleo, com o pico de 2,22 de barris por dia
(bpd).
O que mais impressiona não é exatamente a intenção
privatizante do governo Temer. Afinal isso já era amplamente esperado, desde o
lançamento do documento “Ponte para o Futuro”. Esse foi o momento em que o PMDB
se ofereceu de forma aberta ao mundo financeiro como uma alternativa confiável
para ocupar o Palácio do Planalto e toda a Esplanada dos Ministérios.
Na verdade, o que chama a atenção é que o governo tenha
nomeado para a presidência da empresa alguém que se declare tão abertamente a
favor da venda da empresa para o capital privado. Alguém que vai sabotar de
forma declarada e explícita a capacidade de recuperação da Petrobrás e promover
o retorno do espírito que havia sido sepultado no passado. Para nosso
desespero, estão por aí nos rondando os assombros da PETROBRAX.
Comentários
Postar um comentário