Análise dos noticiários da TV, num dia emblemático, revela: na
Comunicação será travada a batalha central para defender a Previdência
Por Glauco Faria
Quem viu a forma com que o Jornal Nacional tratou a aprovação da PEC 55,
na noite desta terça-feira (13), teve uma amostra do que ainda virá da
cobertura da Globo e dos demais veículos da mídia tradicional – em geral a
reboque do grupo da família Marinho – sobre a “reforma” da Previdência.
Ainda que se dê um “golpe dentro do golpe”, com uma eventual saída de Michel
Temer da presidência, a agenda está dada e tem urgência em ser cumprida. E a
PEC 287 já entrou na ordem do dia.
Na primeira matéria que
abordou a aprovação da proposta que limita os gastos públicos, feita sob o
ponto de vista da articulação política, há o destaque para um trecho do
discurso de Humberto Costa (PT-PE) pedindo mais tempo para a discussão do
texto, com a palavra final sendo de Aloysio Nunes (PSDB-SP). O tucano repete o
discurso oficial, de que a PEC 241 era “urgente, necessária”, com o objetivo de
“tirar o Brasil da crise”.
Feito o protocolo de dar voz a um e a outro parlamentar, seguiu-se a
defesa do projeto, com um gráfico destacando que em 2017 haveria um “aumento”
de 9 bilhões de reais no orçamento da Saúde. Claro, desconsidera-se o que vai
acontecer nos anos subsequentes, já que o orçamento da área entra no teto a
partir de 2018, e também é deixado de lado um outro dado. Com o aumento do
percentual da Desvinculação das Receitas da União (DRU) de 20% para 30%, a
quantia de recursos que poderão ser deslocados do setor será maior. Em
2014, segundo dados da Anfip,
foram 63 bilhões de reais retirados da Seguridade Social, que engloba
investimentos em Previdência, Saúde e Assistência Social. Com a elevação da
DRU, esse número pode chegar a 120 bilhões de reais por ano, algo que o
“acréscimo” de R$ 9 bi nem de longe compensaria.
A matéria seguinte, no
entanto, seria a que sustentaria a existência da PEC da Morte. “Quem já teve
dívidas sabe que se a gente perde o controle delas, o orçamento fica
bagunçado”, abre a reportagem, fazendo a analogia simplista adotada pelo
governo em sua publicidade oficial e nos seus discursos. Aliás, se tal
comparação fosse realmente adequada, talvez o governo devesse prestar atenção
no buraco para onde são drenados a maior parte de seus recursos, o pagamento de
juros da dívida pública.
Como destaca, nesse artigo, Willame Parente
Mazza, doutor em Direito pela Unisinos-RS, desde 2003 o Brasil apresenta
déficit nominal, quando são incluídas as despesas com juros, enquanto o
resultado primário tem superávit em quase todos os anos do período, exceção
feita aos dois últimos, quando houve queda na arrecadação em função da crise
econômica. Ainda assim, o foco da PEC 55 é a despesa primária, e não a que
inclui a conta da dívida pública. “Com efeito, analisando os gastos sociais,
incluindo previdência e assistência social, no período de 1995 a 2014,
consolidamos a média de 28,06% das despesas totais federais, com a menor
variação de 22,28% em 1999, em função do severo ajuste fiscal imposto, mas
compensado com o maior gasto com a dívida pública, que chegou a 62,25% no
período”, aponta.
Mesmo assim, os juros não receberam qualquer destaque na matéria do
Jornal Nacional, talvez porque seja bom ignorá-los. Seguiram-se três
economistas para referendar a aprovação da proposta. “É uma maneira de resolver
o problema, sem avançar na sociedade”, disse um, entendendo-se “avançar na
sociedade” como elevação de impostos. Foi José Marcio Camargo, economista da
PUC-RJ e membro do Instituto Millenium, o mais assertivo, cantando a bola da
vez. “O próximo passo fundamental é a reforma da Previdência”, reiterando
também o que governistas vêm repetindo em
seus discursos.
Enquanto isso, na Globo News, no programa Em Pauta a comentarista de
economia dizia que “claramente as pessoas não
entenderam o que é a PEC”, enquanto apareciam imagens de protestos
contra a proposta na Avenida Paulista. Em sua fala, também reforça a tese de
que a PEC precisa da aprovação da “reforma” da Previdência. Mais adiante, o
programa tem como tema “qual é o plano de previdência
complementar mais adequado ao seu perfil financeiro”.
Nada muito sutil, como se percebe.
Essa é uma pequena mostra de como a comunicação será crucial para o
embate político que vai se seguir nos próximos meses em torno da tentativa de desmonte
do sistema previdenciário brasileiro. Se há algo, mesmo nesse cenário sombrio,
a se louvar, é que as máscaras da mídia estão caindo de forma rápida e o verniz
de imparcialidade já não é uma preocupação de veículos que se sentem mais
empoderados em um ambiente de crise institucional.
Imagem de capa: Latuff
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