– 20 DE MARÇO DE 2017
Crescem as ações da sociedade civil contra entrega do petróleo brasileiro. Justiça já aceita algumas. E futuro governo terá de dizer se acata ou reverter atos de Temer
Por Paulo Metri*, em seu blog
A Petrobras
foi criada, em 1953, em atendimento a grande mobilização popular, ocorrida nos
seis anos anteriores, reivindicando que a riqueza do petróleo, se descoberto —
pois era desconhecido à época — deveria ser usufruída por brasileiros. Ou seja,
visionários foram às ruas, dizendo na verdade que “o petróleo seria nosso”!
Atualmente,
existem inúmeras evidências sugerindo que lideranças políticas e a grande mídia
abraçam a campanha “O petróleo não precisa ser nosso”, tal o grau de entrega
que fazem no setor e, hoje, diferentemente do passado, sabe-se que existe muito
petróleo no país. Ele, se bem aproveitado, irá resultar em invejável índice de
desenvolvimento humano para a sociedade brasileira. Somando as descobertas
recentes declaradas pela Petrobras, porem ainda não certificadas, chega-se a
uma cifra entre 30 e 40 bilhões de barris. No entanto, se interesses políticos
não a proibirem de concorrer para arrematar novos blocos, ela passará a ter
mais de 100 bilhões de barris.
Mas, a mídia
e políticos conservadores argumentam que melhor, para o país, do que uma
estatal é ter a exploração e produção de petróleo concentrada em empresas
privadas, reguladas por uma agência que imporia os interesses do Estado. Assim,
os investimentos estariam disponíveis e uma melhor eficiência seria
alcançada. Ocorre que o setor privado não é necessariamente mais eficiente que
o setor estatal. Além disso, só se pensa em eficiência financeira e, não, em
eficiência social — muito mais importante, e que uma estatal atende melhor.
A escolha
dos investimentos no setor deve considerar os impactos sociais a ser obtidos,
como acarretar o máximo de compras locais, empregar o máximo de brasileiros,
desenvolver o máximo de tecnologia no país. Neste sentido, a retirada da
Petrobras da condição de operadora única do Pré-Sal foi uma decisão contrária
aos interesses da sociedade brasileira. Afirmou-se à época que havia pressa
para a exploração do Pré-Sal, quando os investimentos lá aplicados devem seguir
a velocidade que traz o máximo usufruto social.
A atuação
planejada da Petrobras no Pré-Sal pode induzir um novo ciclo de desenvolvimento
para o país. Muitas agências reguladoras estão “capturadas” pelos entes a ser
regulados. Por isso, aqueles que desejam ver uma sociedade mais justa no Brasil
devem buscar outro modelo para o setor do petróleo, lembrando que o país
precisa ser soberano para poder garantir impactos sociais relevantes, e sabendo
que a Doutrina Monroe, com suas atualizações, nunca foi abandonada.
Uma
discussão escondida da população é em quais atividades o Estado satisfaz melhor
os interesses da sociedade. Além das típicas do Estado, devem ficar com ele
também os empreendimentos de infraestrutura com grande prazo de maturação e
baixa rentabilidade; as atividades que requerem alto grau de segurança; as que
resultam no aumento da soberania nacional e as que geram lucros
estratosféricos. O setor de petróleo enquadra-se em mais de uma destas
categorias. No entanto, a cartilha neoliberal prende-se a um único objetivo, a
maximização do lucro, supostamente atingido pelas petrolíferas privadas e de
que, aliás, a sociedade pouco usufrui.
Hoje,
infelizmente, a nossa sociedade, acreditando nas informações destorcidas pela
mídia, pensa que a Petrobras deve muito acima da sua capacidade de pagamento.
Assim, a tese que a Petrobras precisa vender ativos para pagar sua dívida é
aceita pela população. Contudo, ela não é verdadeira, como pode ser observado
em “A construção da ignorância sobre a Petrobras” de Felipe Coutinho,
presidente da Associação de Engenheiros da Petrobras (AEPET).
É importante
conhecer as atuações passadas, em outros países, das petrolíferas estrangeiras,
pois pela intenção de Michel Temer e do atual presidente da Petrobrás, Pedro
Parente, elas atuarão em novos empreendimentos no Brasil. Encontra-se na
literatura que barreiras éticas não foram respeitadas por estas empresas nas
ações para atingir seus objetivos. Foram protagonistas de tomadas de poder,
financiamentos de guerras, assassinatos, corrupções e outras tramas. Mesmo sabendo
que as posições no mundo mudam, será difícil confiar nas medições delas da
produção de petróleo, das quais dependem os valores dos tributos. Como confiar
nos gastos declarados em segurança das operações e em proteção ao meio
ambiente? Uma estatal, não visando exacerbadamente o lucro, tende a não fazer
estes absurdos.
A atual
atuação das petrolíferas estrangeiras é escamoteada, pois inclui a compra de
políticos para a aprovação de uma legislação que dissimula a maximização do
lucro, e a divulgação, através da mídia cooptada, de inverdades ou a não
divulgação de assunto relevante. Assim, conclui-se que as petrolíferas
estrangeiras, diferentemente da estatal, não objetivam grande contribuição
social.
Ocorre no
Brasil, hoje, uma investida das petrolíferas e outras empresas estrangeiras ao
patrimônio da Petrobras. Existe também a investida dos “espertos” acionistas da
Petrobras no exterior. Eles aproveitam o momento vulnerável da empresa, a falta
de apoio do governo e a colaboração inexplicável de nossas autoridades para
apresentar reivindicações possivelmente injustas. Parente aplicou o “impairment”
de necessidade duvidosa para cálculo do valor de vários patrimônios da empresa,
acarretando preços vis. Parente buscou acabar com a empresa integrada que
possui todas as áreas que maximizam o retorno da produção de petróleo, aquelas
com alta agregação de valor.
No entanto,
a Petrobras reage a estes descalabros aumentando a produção do Pré-Sal, o que
compensa a diminuição da produção da bacia de Campos e diminuindo a necessidade
de importação de petróleo. Tudo isto dificulta Parente de providenciar uma
privatização maior.
Ele buscou
definir como objetivo da Petrobras a descoberta e produção de petróleo, o que
ela faz muito bem. No entanto, vender petróleo in natura, com pouco
valor agregado, para petrolíferas estrangeiras, que são integradas, significa
transferir lucro para os competidores. Temer e Parente praticam hoje um
desrespeito para com todas as gerações de administradores e funcionários da
empresa, presidentes e ministros da República, e políticos diversos que,
durante 63 anos, sustentaram o desenvolvimento desta empresa e a tornaram um
orgulho nacional. Ou seja, ela é a prova que os brasileiros não são atavicamente
subdesenvolvidos. É por esta razão que se conclui que eles estão tentando
destruir não a empresa, mas o orgulho nacional.
Para o
término das obras da Comperj e outros empreendimentos, Parente pretendeu chamar
só empresas estrangeiras. Ele buscou transferir uma parcela do campo de Carcará
para a Statoil e outros campos para a Total, todos a preços vis. A Noruega e a
França aceitaram de bom grado o neocolonialismo. Ele se opôs à exigência de
conteúdo local, junto com as petrolíferas estrangeiras. Ele tentou vender a
Liquigás, distribuidora de GLP, e uma participação na BR Distribuidora, com a
possibilidade de compartilhamento do controle da companhia. Ele buscou
transferir a propriedade de 90% da Nova Transportadora do Sudeste, responsável
pelo transporte de gás natural nesta região, para a empresa Brookfield
Incorporações S/A. Ele foi a favor das parcerias, em que a Petrobras nada
ganha, só perde.
Assim, todas
as empresas que firmaram contratos leoninos com o Estado brasileiro, são
co-partícipes de um crime. Parente está atropelando a lei na sua ânsia pelo
desmonte. É bom que ele aja assim, porque está criando um passivo judicial, que
pode resultar na revisão das decisões. Inclusive, descrevi, neste texto, as
suas atitudes como sendo pretensões, porque para mim tudo feito é passível de
ser revertido na Justiça.
O engenheiro
Ricardo Maranhão, conselheiro da AEPET, apresentou ao TCU uma lista de
irregularidades e ilegalidades no plano de desinvestimentos da Petrobras. Desta
forma, não existe um “ato jurídico perfeito”, não só pelo atropelamento da lei,
como também pela fragilidade política do presidente atual. Fernando Henrique,
que também representou o pensamento neoliberal no poder, não ousou fazer o que
Temer, através de Parente, tenta fazer. Inclusive, depois de 2018, um novo
governante virá e ele pode querer desfazer o que foi feito, quando ocorrerão
embates jurídicos.
Por tudo
isto é louvável que muitos Sindicatos e Federações de Petroleiros têm entrado
na Justiça contra a selvageria desmedida que Parente busca impor à Petrobras e
ao petróleo brasileiro. São alvissareiras as notícias dos deferimentos dos
juízes às ações impostas. Entidades da sociedade civil, como Clube de
Engenharia, OAB, CNBB e outras deveriam também entrar com ações na Justiça, pois
o teatro de guerra é imenso e há espaço para todos.
E se o preço
do barril de petróleo subir substancialmente e a destruição de Parente for
permanente, quão prejudicada será a sociedade brasileira?
—
*Conselheiro
do Clube de Engenharia e do CREA-RJ
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