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Como se faz a resistência aos golpes — o de 1964 e o de agora

 6 de novembro de 2016 por 

Metalúrgicos de Contagem-MG, na greve histórica de abril de 1968
Metalúrgicos de Contagem-MG, na greve histórica de abril de 1968
Um retrospecto histórico revela: diante de derrotas estratégicas, o que corrói a tirania não é o enfrentamento heroico direto — mas a paciente luta de multidões, por agendas muito concretas
Por Breno Altman
Também se constituiu em um processo de derrota estratégica, como agora. Derrubado o governo João Goulart, as forças progressistas deixaram de ser alternativa de poder e tiveram que reorganizar sua política.À direita e à esquerda, quem acreditou em enfrentamento direto ao novo bloco de poder, quebrou a cara.
A oposição liberal-burguesa, parte da qual havia apoiado o golpe, ficou a ver navios com suas expectativas de eleições presidenciais já em 1965.
A primeira leva de alternativas guerrilheiras, cujo epicentro foi o movimento de Caparaó, inspirado por Brizola, em 1966, sucumbiu sem entrar em combate.
O que funcionava era a luta de massa, por agendas concretas, que paulatinamente tirava o povo da letargia e da intimidação.
Começou com a mobilização estudantil contra os excedentes (1966), em uma escalada de lutas reivindicatórias que conflui para as grandes passeatas de 1968.
Os estudantes, a partir de sua luta concreta, vertebraram o amplo sentimento de oposição que vinha se acumulando no país, arrastando a classe média para as ruas.
A politização crescia na medida em que os estudantes enfrentavam o aparato repressivo da ditadura, atraindo a solidariedade de outros setores no combate à ditadura.
A classe operária e os camponeses, muito mais reprimidos depois de 1964, travavam lutas mais tímidas, mas também em 1968 tivemos as greves de Contagem e Osasco, por plataformas econômicas, com a consciência dos trabalhadores se elevando conforme o regime militar avançava nas medidas repressivas e na negação de básicos direitos econômicos.
Houve, então, em 1968, o primeiro ciclo de embates frontais contra a ditadura, quatro anos depois do golpe, a partir de um processo de acumulação com base em batalhas concretas por direitos.
O campo popular foi novamente derrotado, tendo como desenlace o AI-5 e a configuração do regime em uma ditadura militar-fascista. A razão mais importante da nova derrota talvez tenha sido a baixa presença da classe trabalhadora naquele ciclo de mobilização.
Um setor da esquerda resolveu adotar novamente a estratégia de enfrentamento direto, sem base de massa e sem capacidade militar real, recorrendo ao método da luta armada. Heróica e exemplar, em poucos anos havia sido destroçado, com a morte de centenas de combatentes e o isolamento da guerrilha junto ao povo.
Passou-se um período duríssimo, no qual estavam no chão a velha esquerda, atropelada em 1964, e a nova esquerda, armada, que já não sobrevivia em 1973.
Mais uma vez foram as lutas de massa setoriais que permitiram a reorganização da resistência.
Reivindicações estudantis e operárias começavam a brotar, arrastando a simpatia popular.
Também as batalhas institucionais começaram a dar frutos. Mesmo controladas, as eleições de 1974 e 1978 representaram derrotas do partido da ditadura, com o povo insatisfeito pela crise econômica vigente após 1973.
Esse movimento reivindicativo foi crescendo e se unificando.
As jornadas estudantis de 1977 foram o primeiro ensaio de mobilização unitária contra a ditadura, após 1968, estimuladas por uma onda de prisão contra militantes nos primeiros meses daquele ano.
Mas estas só foram possíveis porque as faculdades e escolas já viviam forte efervescência por agendas concretas.
A partir de 1978, ao contrário do que ocorrera dez anos antes, a classe operária entra em cena, a partir da greve da Scania, em São Bernardo.
O movimento se alastra. A reivindicação não era política, mas econômica: reposição de perdas salariais.
Logo chegaríamos às greves gerais dos metalúrgicos do ABC.
Progressivamente os trabalhadores e as camadas médias, entre os quais muitos cidadãos tinham apoiado a ditadura em algum momento, começaram a se dar conta que o centro de seus problemas e das dificuldades do país era a existência do regime militar.
O surgimento do PT, da CUT e do MST são produtos dessa atmosfera. Bem como a reconstrução da UNE e da UBES, entre outras entidades.
O ápice desse ciclo foi a campanha das diretas já, entre 1983 e 1984. O acúmulo de forças, então, de consciência e organização, tornara possível um movimento unitário com objetivo claramente antiditatorial.
A ditadura estava com os dias contados. O resto da história até os mais jovens conhecem.

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