Geopolítica: a
hipótese da Grande Aliança Eurasiana
Rússia e China preparam-se para enfrentar, juntas, as ameaças de
Washington. Mas obsessão hegemônica dos EUA pode ferir a Europa e empurrar a
Alemanha para os braços de Moscou e Pequim. Como esta reviravolta seria
possível?
OutrasMídias
por Dossier SUL
Publicado 09/09/2020 às 14:24 - Atualizado 09/09/2020 às 14:46
Por Pepe Escobar, no Dossier SUL
Todos somos testemunhas de como a
China planeja meticulosamente seus principais movimentos geopolíticos
e geoeconômicos até 2030 e além.
O que lerão a seguir teve origem numa série de discussões privadas
multilaterais entre analistas de inteligência e pode ajudar a traçar os
contornos do panorama geral.
Na China, o caminho claramente aponta para aumento da demanda interna e
para a mudança da política monetária para criar crédito que consolide a
construção de indústrias domésticas de renome internacional.
Paralelamente, há debate sério em Moscou no sentido que a Rússia deva
seguir o mesmo caminho. Nas palavras de um analista, “a Rússia não deve
importar coisa alguma, além da tecnologia absolutamente necessária, e só até
que possa criá-la. Além disso, deveria exportar exclusivamente o petróleo e gás
imprescindíveis para pagar por importações – que devem ser severamente
limitadas. A China ainda necessita de recursos naturais, o que faz dos dois
países aliados especiais. Todas as nações devem ser tão autossuficiente quanto
possível.”
Acontece que essas declarações espelham perfeitamente a estratégia do
Partido Comunista Chinês, como delineado pelo Presidente Xi Jinping
na reunião do Comitê Central em 31 de julho passado. Também vai em sentido
contrário a uma robusta ala neoliberal no PC Chinês – colaboracionistas? – que
sonham com converter o partido à democracia noática, Angela Merkel, Berlim-Moscou-Pequim, Bielorrússia, China, Donald Trump, guerra comercial EUA e China, Hormuz, moscou, OTAN, Pequim, Plano de Ação Conjuntura Global, Vladmir Putin, Xi Jinping estilo
ocidental, subserviente aos interesses do capital ocidental.
Comparar a velocidade econômica de China e de EUA é comparar um Maserati
GranTurismo Sport (equática, Angela Merkel, Berlim-Moscou-Pequim, Bielorrússia, China, Donald Trump, guerra comercial EUA e China, Hormuz, moscou, OTAN, Pequim, Plano de Ação Conjuntura Global, Vladmir Putin, Xi Jinpingipado
com motor V8 Ferrari) e um Toyota Camry. Proporcionalmente, a China tem enorme
reserva de gerações jovens muito bática, Angela Merkel, Berlim-Moscou-Pequim, Bielorrússia, China, Donald Trump, guerra comercial EUA e China, Hormuz, moscou, OTAN, Pequim, Plano de Ação Conjuntura Global, Vladmir Putin, Xi Jinpingem
educadas; migração acelerada do ambiente rural para o urbano; erradicação
crescente da pobreza; mais poupança; sentimento diferenciado de satisfação;
mais disciplina social – confucionista; e respeito infinitamente maior pela
mente racionalmente educada. Na China, o processo de crescimento do comércio
interno será mais que suficiente para manter a dinâmica, em andamento, do
imprescindível desenvolvimento sustentável.
O fator hipersônico
Enquanto isso, no front geopolítico, ática, Angela Merkel, Berlim-Moscou-Pequim, Bielorrússia, China, Donald Trump, guerra comercial EUA e China, Hormuz, moscou, OTAN, Pequim, Plano de Ação Conjuntura Global, Vladmir Putin, Xi Jinpingo
consenso em Moscou – do Kremlin ao Ministério do Exterior – é que o governo
Trump é “incapaz para acordos”, eufemismo diplomático para se referir ao que se
descreve também como bando de mentirosos; e também “incapaz para a legalidade”,
outro eufemismo, desta vez para designar, por exemplo, o lobby para
forçar que os EUA disparem o gatilho das sanções, quando se sabe que Trump já
abandonou há tempos o JCPOA (Joint Comprehensive Plan of Action,
também “Plano de Ação Conjunta Global”).
Recentemente, o Presidente Putin comentou que negociar com a equipe de
Trump é como jogar xadrez com um pombo: o pombo anda pelo tabuleiro e espalha
merda, derruba peças, declara vitória e some. Por outro lado, os mais altos
níveis do governo russo empenham esforço concreto para consolidar uma aliança
eurasiana definitiva, unindo Alemanha, Rússia e China.
Mas essa aliança consolidada só será possível na Alemanha, depois de
Merkel. De acordo com um analista (norte)americano, “o que segura a Alemanha é
o medo de perder suas exportações de automóveis e outros bens para os Estados
Unidos, mas não é difícil explicar que isso acontecerá em breve, por causa da
taxa de câmbio dólar/euro, com o euro cada vez mais caro.”
No front nuclear, para além da situação dramática na Bielorrússia
– já que não haverá Maidan em Minsk – Moscou já tornou bem claro, em
termos contundentes, que qualquer ataque de mísseis da OTAN será interpretado como
ataque nuclear.
Acredita-se que o sistema de mísseis defensivos russos – dentre eles o
já testado sistema S-500, e a seguir o sistema S-600, já projetado – possa ser
99% efetivo. Significa que a Rússia ainda sofrerá danos, em caso de ataque. Não
por outra razão, a Rússia construiu uma extensa rede de abrigos antibombas
nucleares nas grandes cidades, com capacidade para pelo menos 40 milhões de
pessoas.
Analistas russos veem a mesma tendência também na atitude chinesa de
defesa. Pequim pode desenvolver – se já não o fez – um escudo defensivo; e
mesmo assim preservar a possibilidade de contra-atacar os Estados Unidos com
mísseis nucleares.
Os melhores analistas russos, dentre eles Andrei Martyanov, sabem que as
três principais armas em uma suposta guerra no futuro serão os mísseis
ofensivos/defensivos e submarinos combinados com capacidades para guerra
eletrônica.
Atualmente, a principal arma – e os chineses compreendem-no muito bem –
são os submarinos nucleares. Os russos observam como a China constrói sua frota
de submarinos – carregados de mísseis hipersônicos –, mais rapidamente que os
Estados Unidos. Frotas de superfície estão obsoletas. Uma alcateia de
submarinos chineses pode derrotar facilmente um porta-aviões e respectivo grupo
de combate. De fato, todos os 11 porta-aviões dos EUA já são obsoletos.
Assim, na possibilidade horrenda de que se torne impossível navegar por
mar, no caso de EUA, China e Rússia bloquearem todo o tráfego marítimo, pode-se
ver a principal razão estratégica pela qual a China optou por manter por terra,
a partir da Rússia, as rotas pelas quais circulam muitos de seus recursos
naturais.
Dutos de transporte terrestre de petróleo e gás podem ser rapidamente
reparados, no caso de serem bombardeados. Essa é a enorme importância que tem,
para a China, o gasoduto Energia da Sibéria – e também da gama estonteante
de projetos da empresa russa Gazprom.
O fator Ormuz
Segredo guardado a sete chaves em Moscou é que, logo depois de a
Alemanha ter imposto sanções em função da Ucrânia, um grande operador global de
energia apresentou proposta, à Rússia, para redirecionar para a China nada
menos que 7 milhões de barris diários de petróleo, além de gás natural.
Aconteça o que acontecer, essa impressionante proposta permanece sobre a mesa
de Shmal Gannadiy, alto conselheiro do Presidente Putin para assuntos de
petróleo e gás.
No caso de a proposta vir a ser implementada, a China assegura-se de que
receberá, a partir da Rússia, todos os recursos naturais de que precisa. Nessa
hipótese, reação lógica da Rússia seria contornar as sanções da Alemanha e
levar suas exportações de petróleo para a China, a qual, do ponto de vista
russo, tem tecnologia de consumo melhor que a Alemanha.
Claro que tudo isso pode mudar com a iminente conclusão do Gasoduto Ramo
Norte 2 (ing. Nord Stream 2) – apesar de a equipe Trump manter sua política de
não poupar prisioneiros, ao sancionar tudo e todos relacionados ao assunto.
Conversas de inteligência nos bastidores deixam bem claro para os
industriais alemães que, se a Alemanha perder sua fonte russa de energia em
petróleo e gás natural, combinado com o eventual bloqueio do Estreito de
Hormuz, no caso de ataque (norte)americano contra o Irã, a economia alemã pode
simplesmente desabar.
Conversas de inteligência acontecem por todo o país, sobre alguma
possível Surpresa de Outubro patrocinada pelos Estados Unidos – um ataque sob
falsa bandeira pelo qual o Irã seria responsabilizado. A equipe de “pressão
máxima” do governo Trump contra o Irã nada tem a ver com o JCPOA. O que
importa é que, mesmo indiretamente, a parceria estratégica Rússia/China tornou
claro que Teerã será protegida como ativo estratégico importante – e ponto
crucial da integração da Eurásia.
As considerações de inteligência centram-se no possível cenário da –
muito improvável – queda do governo iraniano. Neste caso, o primeiro movimento
de Washington seria desconectaro sistema SWIFT de compensações bancárias
internacionais. O alvo seria a economia russa, para ser destroçada. Por isso
Rússia e China estão trabalhando aceleradamente para inaugurar e pôr em
operação seus próprios sistemas de compensação: MIR russo e CIPS chinês. E para
deixar de lado o dólar, no seu comércio bilateral.
Pequim já percebeu que caso se confirme este cenário, a China pode
perder de uma só vez dois aliados cruciais; nesse caso, estaria sozinha para
enfrentar Washington, apanhada em estágio no qual pode não ser capaz de
assegurar o fornecimento dos recursos naturais de que tanto necessita. Trata-se
de ameaça existencial real. Isso explica o raciocínio por trás da crescente
interconexão na parceria estratégica entre China e Rússia, e o acordo com
duração de 25 anos no valor de $400 bilhões de dólares, com o Irã.
A volta de Bismarck
Outro possível acordo secreto já discutido nos mais altos escalões da
inteligência é um Tratado de Resseguro Bismarckiano, a ser estabelecido entre
Alemanha e Rússia. A consequência inevitável seria uma aliança de fato
Berlin-Moscou-Pequim abrangendo a Iniciativa Cinturão e Estrada, com criação
simultânea de uma nova moeda – digital? – para toda a aliança eurasiana, que
incluiria atores periféricos, mas importantes, como França e Itália.
Muito bem. Pequim-Moscou está feito. Pequim-Berlin é trabalho em
andamento. Falta cuidar do Berlin-Moscou.
A situação representa não só tremendo pesadelo para a elite
anglo-norte-americana infartada de Mackinder,
mas na realidade, implica também a passagem do bastão geopolítico, da mão dos
impérios marítimos, de volta à mão da massa terrestre da Eurásia interior.
Deixou de ser ficção. Está sobre a mesa.
Aproveitando o ensejo, voltemos um pouco no tempo, até o ano de 1348.
Os mongóis da Horda Dourada estavam na Crimeia, sitiando Kaffa – porto
comercial no Mar Negro controlado pelos genoveses.
De repente, o exército mongol começa a ser dizimado pela peste bubônica.
E passa a catapultar cadáveres contaminados, para dentro da cidade da Crimeia.
E o que aconteceu, quando os navios começaram a navegar, de Kaffa para
Gênova? Levaram a praga para a Itália.
Em 1360, a Morte Negra estava literalmente em toda parte – de Lisboa a
Novgorod, da Sicília à Noruega. Talvez tenha dizimado cerca de 60% da população
da Europa – mais de 100 milhões de pessoas.
Pode-se argumentar que a peste teria retardado por um século o
Renascimento.
A Covid-19 não é peste medieval, longe disso. Mesmo assim, cabe
perguntar: que Renascimento estaria sendo retardado?
Bem, o que se pode dizer é que, na realidade, a pandemia de
Covid-19 já está fazendo avançar o Renascimento da Eurásia. Ocorre justamente
quando o Hegemon, ex-“fim da história”, explode internamente [“Sobre faces
tensas repuxadas pelo tempo”] “Distraída da distração pela distração” [“Cheias
de fantasmagorias e ermas de sentido]”,[3] para citar T. S. Eliot. Atrás
do nevoeiro, nas excelentes pastagens à sombra, os movimentos vitais para
reorganizar a massa terrestre do interior da Eurásia já estão em movimento.
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